EMPIRE MAGAZINE (JUNHO.2024) – Em Hit Man, Glen Powell interpreta um assassino falso, na verdade, vários assassinos falsos. Enquanto ele e o diretor Richard Linklater lançam seu thriller de comédia romântica, a dupla de matar discute sua colaboração crescente.
É uma declaração ousada de Glen Powell, “Eu estou saindo do negócio completamente,” ele diz para Richard Linklater, seu amigo e colaborador, enquanto os dois conversam com a Empire pelo Zoom. A implicância continua. “Eu acho que fizemos,” continua Powell. “Fizemos o que precisávamos fazer.”
Ele está brincando, mas é o testamento do filme que Powell e Linklater acabaram de fazer. O ator está conversando com a Empire de sua casa em Los Angeles, nos dando um tour de seu quarto da frente. Caixas e fotografias emolduradas estão no chão ao redor dele, enquanto ele está se preparando para mudar novamente para o Texas, seu estado natal. E mês que vem, Hit Man chega aos cinemas, também marcando um novo capítulo para Powell.
Essa seria a pior hora possível para ele trocar de barco. Graças a sua parceria de longa data com Linklater – a dupla agora já trabalhou em quatro projetos ao longo de quase duas décadas – e seus próprios triunfos nas bilheterias como Top Gun: Maverick e Anyone But You, o status de Powell chegou à estratosfera. Mas Hit Man é a primeira vez que a dupla colaborou no roteiro, e dá a Powell o primeiro crédito de roteirista em sua carreira. Um estudo de personagem sexy e confuso, que é levemente baseado em Gary Johnson (Powell), um homem que trabalhava disfarçado para a polícia na vida real durante os anos 90, posando como um assassino de aluguel para incriminar criminosos. Criando sua história desde os sonhos do ensino médio até a brigas de faca mexicanas, Linklater e Powell contam à Empire o que faz sua dinâmica ser matadora.
O CONTRATO
“Rick sempre esteve no topo do Monte Rushmore dos cineastas,” Powell diz quando descreve o impacto de Linklater na sua carreira. “É uma montanha pequena, a propósito,” esclarece Linklater. Powell continua, “É mais como uma colina, mas ainda é impressionante!”
Montanha, colina, monte – você pode chamar do que quiser, mas não tem como negar que a influência do cineasta está presente desde que Powell, agora com 35 anos, decidiu se envolver em filmes. Ele menciona uma aula de escrita criativa que fez no ensino médio, na qual ele era o único aluno explorando a criação de roteiros. O seu professor lhe mostrou o trabalho de Linklater. “Meu amor pela escrita realmente começou com os filmes de Rick, e poder escrever com ele nesse ponto da minha vida, numa idade apropriada, tem sido um ciclo completo,” ele resume.
Nós rapidamente discutimos Fast Food Nation, uma sátira de Linklater de 2006 que incluiu um Powell adolescente em um pequeno papel, e o cineasta é rápido ao confirmar que a relação dos dois era bem diferente do que é hoje. “Seria bem estranho se tivéssemos nos tornado amigos,” ele ri. “Eu estava com trinta anos e ele era um aluno do ensino médio.”
Oito anos após Fast Food Nation, Linklater estava fazendo audições para Everybody Wants Some!!, um filme situado na faculdade nos anos 1980 que foi baseado nas suas experiências jogando no time de baseball da Sam Houston State University. Quando Powell entrou, Linklater teve dificuldade para conectar o jovem homem à sua frente com o garoto do colegial que ele havia conhecido há quase uma década. “Ele era tão inteligente, esperto e engraçado; ele era exatamente o que o filme precisava,” ele se lembra. “Eu estava tão animado para poder me reconectar com um Glen adulto, que naquele ponto já tinha vivido uma vida.”
Everybody Wants Some!! tem um grande elenco, mas Powell se garante como Finn, um estudante da faculdade cuja vontade de viver é tão grande e proeminente como seu bigode dos anos 80. Linklater descreve o personagem como a destilação de tudo que ele queria dizer com o filme: um atleta que desafia o estereótipo com sua cordialidade e sagacidade. “Eu estava procurando por rapidez e capacidade neural, além de charme e beleza,” ele explica.
O diretor fez o elenco ficar no seu rancho nas redondezas de Austin antes das filmagens. Eles dividiram camas e jogaram futebol, o objetivo era formar um sólido e funcional time antes de seu tempo juntos à frente das câmeras. Powell levou a experiência para o coração. “Ele ficou tipo, ‘Uau, eu posso ficar melhor aqui. Como podemos melhorar isso?’ Ele agarrou essa oportunidade e se manteve com ela,” Linklater se lembra. “Você está chegando para jogar o jogo, não descobrir o esporte,” explica Powell.
Depois do lançamento do filme em 2016, eles mantiveram contato, trocando ideias sobre qual seria sua próxima colaboração. Em 2020, Linklater trouxe Powell para interpretar o oficial da NASA Bostick, um pequeno mas significativo papel em seu filme animado Apollo 10½: A Space Age Childhood. Então, depois disso, a quarentena começou, e quando o mundo fechou, Powell ligou para Linklater com uma ideia que iria aumentar substancialmente sua parceria. Eles estavam prestes a se comprometer.
O HIT
Gary Johnson foi um assassino de aluguel com uma vida dupla. Em 2001, o jornalista Skip Hollandsworth – cuja reportagem levou a um filme de crime de Linklater de Bernie em 2011 – escreveu um artigo para a Texas Monthly sobre o falso assassino de aluguel. Durante o dia, Johnson era um professor de psicologia, com um jardim de glicínias e um livro de mesa de café de Gandhi, e seu mundo contraditório deixou uma marca em Linklater. Aqui estava um homem que poderia assumir qualquer nova identidade, convencer um cliente de que ele era capaz de matar alguém por dinheiro, e então voltava para casa para alimentar seus dois gatos.
Linklater leu o artigo um ano após sua publicação e, com pensamentos de desenvolver como uma comédia sombria, conversou com Hollandsworth, que lhe deu caixas de imagens de segurança granuladas de Johnson em ação e transcrições de suas entrevistas. “Eu realmente coloquei algum tempo nisso, mas nunca funcionou totalmente como um filme na minha cabeça,” Linklater se lembra. E então, Johnson ficou no fundo da sua cabeça por 20 anos. Até que Powell ligou.
O ator tem um bom nariz para boas histórias: em uma viagem de pesca ele leu o livro Devotion: An Epic True Story of Heroism, Brotherhood and Sacrifice, de Adam Markos, sobre pilotos dos anos 1950, que ele acabou produzindo e estrelando na adaptação para o cinema. Quando ele leu o artigo de Hollandsworth, seu instinto apareceu novamente, particularmente quando ele chegou numa parte da história onde Johnson decide ajudar uma mulher que o contratou para matar seu parceiro abusivo. Powell e Linklater conversaram sobre a história durante longas horas de pandemia, até que o diretor sugeriu colocarem suas ideias em um roteiro conjunto. Linklater tem experiência aqui, previamente colaborando com Ethan Hawke e Julie Delpy quando escrevendo Before Sunset e Before Midnight. “Muito do meu processo de ensaio é a reescrita, sou eu tendo novas ideias com atores,” ele explica.
Eles já tinham a planta para Gary (e seus gatos) graças à investigação de Hollandsworth. Mas quanto mais eles conversavam, mais se encontravam brincando com o gênero. “Nós sentimos a liberação de pegar o crime e os elementos de thriller erótico e misturar tudo,” Powell diz. “Começou a tomar uma forma que se aproximava de uma crise de identidade que Gary Johnson teve, de uma bela forma.”
Uma história de amor surgiu entre seu assassino de aluguel e a mulher (interpretada por Adria Arjona) que o contratou para matar seu parceiro, o que forçava Gary a se manter em seu personagem mais enigmático, mais afável e seguro, Ron. Powell linka a história com Tootsie. “O que me veio à cabeça foi a ideia de que alguém misógino tivesse que vestir a fantasia de uma mulher, e então encontrasse um novo respeito pelas mulheres,” ele explica o personagem de Dustin Hoffman naquele filme. “Eu achei que era interessante ter alguém que ensina humanidade [Gary, o professor de psicologia], mas não engaja com isso, colocar a pele de alguém que engaja com isso de uma forma diferente.”
Finalmente, eles começaram a trabalhar com o diálogo. Tem uma analogia que Linklater pega emprestado de seu colaborador da trilogia Before, Hawke, quando descreve elevar seu roteiro ao próximo nível. “Ele ficava tipo ‘Você tem a história’ – e nós realmente a tínhamos, pedaço por pedaço – ‘na hora que você está escrevendo o diálogo, você está apenas trabalhando com as letras para se encaixarem na música que você já escreveu’” ele explica. (“É claro que isso vem do Ethan”, Powell responde de forma calorosa).
Eles tinham a música, eles tinham as letras; agora era hora de tocar a peça.
A EXECUÇÃO
Linklater está se lembrando de um dia de outono em Nova Orleans, 2022, com um cara enrolado em sombras, tatuagens no pescoço e cabelo longo escondido embaixo de uma bandana que se aproximou da área onde Hit Man estava sendo filmado. Nem a equipe percebeu que era Glen Powell. “Eles não sabiam que era ele; eles acharam que alguém tinha invadido o set,” o diretor se lembra. Isso se tornou um ritual para Powell, que interpreta Gary enquanto Gary interpreta uma variedade de assassinos de aluguel falsos, todos com fantasias e sotaques distintos. “Teve um momento antes de começarmos toda cena onde todo mundo apenas ria porque [quando eu saí da van] era ridículo,” Powell diz.
Cada pseudônimo é criado sob medida para as expectativas dos clientes de Gary, desde um russo estranho com uma jaqueta de chuva de couro e um cabelo curto preto, até um tipo de Wall Street com cabelo cheio de gel e um terno poderoso. Powell lia livros sobre as diferentes caminhadas das pessoas e características para incorporar esses personagens da forma que Gary fazia, em vez de deixar que a magia do cinema ajudasse. “Nós não estávamos lidando com próteses, estávamos lidando com coisas crescidas em casa, coisas simples que mudam o seu rosto mas não fazem alguém se perguntar ‘A pele desse cara é de verdade?’” diz Powell. No final, ele acredita que o filme é sobre fantasia, e que ele se divertiu demolindo psicologicamente os clientes de Gary e fazendo uma engenharia reversa para seus assassinos ideais.
De fato, o filme usa o histórico da psicologia de Gary para trazer grandes temas de identidade. Antes de sua jornada como Ron começar, Gary faz a pergunta a alguém: “Quando você se torna aquela pessoa que está fingindo ser?” É uma pergunta que ressoa com Powell de certa forma, aqui interpretando um personagem principal, co-escrito por ele mesmo, pela primeira vez. “Eu já passei muito tempo falhando em Los Angeles; eu estou trabalhando com isso desde os 10 anos de idade”, ele reflete. “Me mudando para LA, o sucesso definitivamente não foi rápido.” Um ponto especialmente baixo apareceu, onde o ator sentiu que Hollywood tinha acabado para ele. Em vez de desistir, ele fez uma escolha: mentir para si mesmo, e acreditar completamente naquela mentira. “[Eu estava dizendo] ‘Essa é apenas a parte da história onde o personagem perde tudo e estão tentando fazer com que ele desista. Todo roteiro faz isso.’” Ele se apoiou nas suas aspirações, operando na base de que, um dia, ele iria trabalhar com pessoas como Linklater, interpretando os personagens que ele queria interpretar.
Enquanto Gary estava ocupado interpretando papeis nas vidas de outras pessoas, tudo o que Powell queria era interpretar Gary.
O RESULTADO
“Você sabe o que é isso? Uma luta de facas mexicana? Esses dois texanos podem explicar para você.”
Linklater está tentando resumir a ética de trabalho que ele compartilha com Powell hoje, após Hit Man, como uma estrada aberta levando a futuras possibilidades. Powell está rindo enquanto outra metáfora de esportes chega à conversa. “Primeiro, você se amarra um ao outro pelo punho, e então você puxa, então não tem como fugir”, o diretor resume enquanto gesticula.
É uma dinâmica que Powell tinha sentimentos fortes durante as gravações e durante o intenso período de pós produção. “Eu preciso dar crédito ao Rick; ele tem feito filmes pelo tempo que faz e ainda não perdeu nem um pouco do entusiasmo,” Powell diz alegremente. “Então, nós trabalhávamos até o osso. Ele achava que eu nunca dormia, e Rick, bem, você não pode cansar esse cara. Nós trabalhávamos noite e dia.” E foi assim que eles ficaram até o final, juntos, animando o outro a continuar. “Nós sempre podíamos fazer um filme melhor,” Linklater se lembra.
Esse filme ganhou aplausos de pé no Venice Film Festival, onde teve sua premiere no último setembro, e então novamente no Toronto Film Festival algumas semanas depois. A greve de atores significou que Powell teve que passar por essa experiência de forma secundária, através de ligações animadas de Linklater. Mas a experiência coletiva apenas cimentou o desejo deles de trabalharem juntos novamente. Eles estão, no momento, trocando ideias, mas sem surpresa, não há pressa de comprometer o tipo de história que eles querem contar. “Estamos tentando descobrir o que nos deixa animados,” Powell diz. “Eu acho que isso que é especial sobre Hit Man, quanto mais conversávamos sobre, o mais animados ficávamos.”
A dupla tem muito para lhes manter ocupados até lá. Powell vai aparecer em um blockbuster em Twisters, e está co-escrevendo e estrelando em Chad Powers, uma série de comédia sobre um quarterback desonrado. Linklater está trabalhando em vários projetos entre sua ambiciosa adaptação de 20 anos de Merrily We Roll Along de Stephen Sondheim. Ainda sim, enquanto sua luta de facas mexicanas continuar, esses dois estarão perto um do outro, sempre se desafiando a fazer um filme melhor. Eles estão longe de terem terminado o que tem que fazer.
Hit Man chega aos cinemas dia 24 de maio e na Netflix 07 de junho [nos Estados Unidos].
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